quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

A vida secreta dos objectos - O anjinho de Natal



Afinal foi falso alarme. Ainda não foi hoje que ela me pendurou na árvore de Natal. Quando ela levantou a tampa da caixa, o meu coração disparou. Achei que tinha chegado a hora e que finalmente ia respirar outro ar, que ia poder observar o movimento diário aqui de casa, pelo menos durante algumas semanas. Mas não. Só veio remexer nas bolas e nas correntes de luzinhas, como quem inspecciona o seu estado, só para decidir o que vai utilizar. Não foi hoje, ainda, que ela armou a árvore de Natal. Voltámos todos para as caixas, sem saber o que vai acontecer este ano e quem vai ser escolhido para a festa. Já vai para dois anos que nem eu, nem as bolas de “papel machê”, temos a sorte de passar o Natal fora da caixa. Foi desde que ela arranjou umas figurinhas de renas, estrelas e pinheiros de feltro. Eles é que têm estado de serviço. Eu já nem me aguento, com as dores que tenho nas costas de estar para aqui enrolado anos a fio. Ai, a inveja que eu tenho dos outros anjos cá de casa! Mesmo aqui por baixo da nossa caixa, na porta do louceiro está um, dependurado na chave, com as suas franjas de seda a balouçar. No quarto, vivem uma série deles. Uns estão pregados na parede, outros espalhados sobre uma mesa, dois sobressaem de pequenos quadros. Eles sim, têm vida. São anjos diários. Têm trabalho fixo. Já eu tenho que me contentar com esta breve passagem anual, em que durante alguns dias nos cantam glórias, mas que assim que acaba a festa, nos arrumam num canto escuro e não mais se lembram de nós.
Publicado também para a Fábrica de Letras

14 comentários:

  1. Luísa,
    Ter anjos de sobra só revela sabedoria. Nunca se sabe o que pode acontecer... :)

    Beijo :)

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  2. Estou a ver que, por aí, há descontentamento e não tem havido muita democracia... há quem não tenha saído da caixa ;))))

    Bjos

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  3. Imagino o que este anjinho escreverá no seu diário durante o resto do ano... talvez sejam relatos um bocado monótonos.
    ...Tristes vidas têm os objectos :(

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  4. AC,
    Não se pode dizer que não estou bem guardada...:)

    Isa GT,
    Tenho que rever a minha posição... ou ainda me arrisco a ter uma manifestação de anjos cá em casa :)

    Johnny,
    Estes objectos são como certas espécies animais... hibernam. Não creio que matenham diários. :)

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  5. Anjinhos, gosto de anjinhos, são inocentes, puros, amigos. Cá em casa há muitos anjinhos, nenhum santo mas, muitos anjinhos. No quarto, no Hall, durante todo o ano.

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  6. Cuidado, Luisa! Olhe que pode haver uma fuga de informação! Aconselho-a a paparicar o tal anjinho! : )

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  7. Querido anjo, podes sair raramente da tua caixa, mas és um artista!
    É que eu acabei de ouvir um ANJO a declamar um monólogo e isso não é para todos.

    bjs :)

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  8. Um excelente texto para a Fábrica das Letras e não só, porque fiquei com pena desse anjinho ;-)
    Também gosto de anjos, fazem-nos bem!

    Beijinhos

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  9. Brown Eyes,
    Este também tem muita companhia... dentro e fora da caixa. De solidão é que ele não se pode queixar. :)

    Catarina,
    Pois é... tenho que pensar seriamente em lhe dar algum destaque neste Natal...mas pensando bem com esta coisa de o trazer aqui para o blog, ele deve estar mas é todo vaidoso por ter tanta gente a reparar nele. :)

    MZ,
    Eu, o anjo, agradeço o seu comentário. Ui... até estou a ficar babado. :)

    El Matador,
    Não tenhas pena... ele às vezes é muito queixinhas. :)

    Fê,
    Obrigada. Não se rale com ele... já decidi que o vou colocar em destaque no trono do Menino Jesus, quando armar o presépio. :)

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  10. luisa, coloca o anjinho fora da caixa :)

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  11. Anjinho com inveja? Deve estra na idade do armário...

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  12. Carlos,
    Este está é na idade da caixa... :)

    Tulipa,
    Vou colocar, sim. :)

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  13. Que lindo conto com anjos. O anjo protagonista tem toda a razão de estar pesaroso! Que é isso de haver anjos de primeira e anjos de segunda? Mas até no mundo dos anjos é assim.
    Muitos parabéns,

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